terça-feira, 19 de maio de 2009

Cashback

Só comecei a pensar sexualmente nela quando assisti "cashback" pela quinta vez - duas semanas depois do único beijo que trocamos - antes de ter visto aquele filme tudo era inocente e angelical demais, pensei sobre o tempo, é inevitavel pensar no tempo quando se assiste "cashback" e pensei também nas pernas dela.
O rapaz do filme sempre quis ser pintor e as formas femininas o inspiravam, enquanto ele vagava pelo tempo congelado ia despindo e pintando todas as mulheres, eu nunca vi as pernas dela, mas o fato de eu ter visto em algum lugar que a perna é a parte que Valéria mais gosta nela mesma me fez imaginar suas pernas em tempo irreal, enquanto eu olhava pro teto ia perdendo a noção do que era ou não apropriado de se pensar, se eu soubesse pintar faria um milhão de quadros só com aquelas pernas que eu nunca vi, mas eu só sabia escrever e a falta de contato começava a limitar minhas palavras, transformando lentamente a fascinação em um desejo tosco, podre e semi-platônico.
Queria ser que nem o Ben, controlar o relógio, voltar dias atrás e parar tudo de novo, parar a música mal instrumentada que a banda tentava tocar, parar com as indiretas do nosso amável amigo em comum e impedir a brasa de queimar mais um pouco me deixando cada vez pior, principalmente pararia o tempo pra ver seus olhos - mesmo que eles estivessem fechados -, respeitosamente tiraria os seus sapatos, levantia sua calça até a altura do joelho, tocaria suas pernas recém descobertas com as pontas dos dedos (como uma criança que passa as mãos delicadamente em cima de um bolo de chantilly e tem de ser discreta pra ninguém perceber), pegaria nas suas mãos, subiria até os ombros, beijaria seu pescoço, descobriria finalmente cada linha e cada centímetro daquele corpo inteiro, cada dobra e perfume do seu interminável e sedutor conjunto de pele morena, eu saberia então descrever cada detalhe escondido na sua perfeição.
Esse raciocinio maluco me fez delirar cada vez mais nas minhas projeções, pensei que se um dia tivesse a oportunidade de fazer amor com ela, eu faria devagar, apreciaria cada curva com um tempo só nosso e naquela noite todas as coisas seria nossas, os sentimentos, as sensações, os odores e todos os elementos noturnos seriam nossos, inclusive as estrelas, a lua e os nove planetas alinhados, celebrando junto comigo aquele momento tão único, a primeira vez que Valéria me mostraria suas pernas de ouro, eu a tocaria da mesma maneira, não pela necessidade de discrição, mas pelo prazer da delicadeza.
Poderia pensar em trilhas sonoras, cores de lençóis e dias da semana pra busca-la em qualquer lugar que fosse, mas eu não precisava de nada disso, nenhum recurso sexualmente clichê ajudaria a fazer daquela noite ainda mais especial, só Valéria - linda, nua e virgem - se despindo lentamente como se aquilo fosse um ritual de passagem, como se tirar as roupas fosse mais importante e sensual do que o sexo em si, sonhava com as nossas roupas jogadas no chão, meu cinto marrom se enrrolando na calça jeans dela, pensei no dia seguinte, na cara que ela ia fazer quando acordasse, nos seus cabelos indígenas bagunçados e se ela preferia tomar café na padaria ou ali mesmo na cama de todas as cores do mundo.

M.Utida

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